”Não é liderança climática. É hipocrisia climática”: Cúpula dos Povos denuncia países ricos com “mãos vazias” e exige reparação histórica

Coletiva de imprensa, realizada na Casa da Cúpula dos Povos para avaliar a Cúpula dos Líderes que finalizou nesta sexta-feira critica falta de compromisso com o fim dos combustíveis fósseis, alerta para a captura de mecanismos de proteção da Amazônia pelo mercado e reafirma a agenda de luta em seis eixos temáticos. A articulação lançou uma nota com posicionamento político BELÉM, PARÁ (BRASIL), 7 de Novembro de 2025 – Em um contraponto direto à Cúpula de Líderes da COP30, os movimentos sociais e organizações populares que compõem a Cúpula dos Povos realizaram uma coletiva de imprensa nesta sexta-feira (7) para demarcar sua posição e denunciar a inércia dos países do Norte Global. O evento ocorreu na Casa da Cúpula dos Povos, Belém (PA), e reuniu representantes da Articulação Climática Global (CAN Internacional), do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), da Campanha Global por Justiça Climática (DCJ) e da Via Campesina (LVC). A COP da “verdade vazia” e a injustiça do financiamento A crítica central foi direcionada à ausência de compromissos reais por parte das nações ricas. Jacobo Ocharan (CAN Internacional/México) destacou a expectativa sobre a COP30 ser a “COP da Verdade”, mas lamentou a falta de ação concreta: “Até o momento há pouca verdade e muito vazio de compromisso por parte dos países historicamente responsáveis pela crise climática.” Ocharan denunciou que os países ricos chegaram “com as mãos vazias, sem planos nacionais (NDCs) realistas nem compromissos concretos com a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis.” Transição energética injusta e racismo ambiental A representante brasileira Isabely Miranda (MAM/Brasil) questionou o conceito de “transição energética” promovido pelos governos, caracterizando-o como uma mera “expansão energética” imposta de cima para baixo. A militante do MAM criticou o modelo de transição baseado na exploração de minerais e a disparidade entre hemisférios. Ela ressaltou que as soluções devem partir das comunidades, pedindo compromisso real das corporações que causam a degradação: “As grandes mineradoras, as indústrias e o agronegócio precisam parar de nos matar e de matar a natureza.” Reparação, não caridade: A crítica à hipocrisia climática O ativista Tyrone Scott (DCJ/Reino Unido/Jamaica) trouxe a voz dos pequenos países insulares, lembrando o recente furacão Melissa na Jamaica e denunciando a dívida e a exploração histórica. Scott foi incisivo ao condenar a hipocrisia das nações que lucraram com o colonialismo e a escravidão: “O que o mundo precisa não é de caridade, mas de justiça.” Ele criticou o uso de mecanismos de mercado e condenou governos que expandem a exploração de combustíveis fósseis: “Não é liderança climática. É hipocrisia climática.” Essa mensagem foi reforçada por Jyoti Fernandes (La Via Campesina/Reino Unido/Índia): “Reparações, não caridade.” A LVC defende um financiamento climático público, rejeitando o modelo de financiamento privado, condicionado e de caráter neocolonial, e afirma: “Acreditamos na vida. E é por ela que lutamos.” Convergência de lutas e eixos estratégicos Beatriz Moreira (Secretária Operativa da Cúpula dos Povos/MAB) relembrou que o processo da Cúpula iniciou-se há dois anos e hoje reúne mais de 1.100 organizações, iniciando em Belém em solidariedade às vítimas de violência no Pará. A Cúpula dos Povos está organizada em seis eixos estratégicos que guiam suas plenárias e mobilizações: Justiça Climática e Reparação. Transição Justa, Popular e Inclusiva. *Soberania Alimentar. Direitos Territoriais e das Florestas.* Internacionalismo e Solidariedade. Perspectivas Feministas e dos Povos nos Territórios. Beatriz finalizou reforçando a autonomia e a capacidade de organização dos movimentos: “Se existe uma solução para o desequilíbrio que vivemos, ela está em nós — nos povos que habitam e defendem os territórios.” Próximos passos A Cúpula dos Povos terá uma intensa programação a partir do dia 12, focada em plenárias de discussão sobre os seis eixos de atuação, construção da Carta dos Povos, barqueata, marcha por Justiça Climática, banquetaço e audiência com a presidência da COP 30. Foto:Samara Silva/EficazPress
BARQUEATA INTERNACIONAL DE CARBONO ZERO CHEGA A BELÉM PARA DESAFIAR O LOBBY FÓSSIL DA COP 30

BELÉM, PA – Uma frota de seis veleiros, batizada de Flotilla for Change (Flotilha pela Mudança), está a caminho de Belém, trazendo uma delegação de cerca de 50 ativistas, cientistas e delegados de diversas partes do mundo. A mobilização transcontinental, que tem como navio-bandeira o Sababa (que partiu da Nova Zelândia e navegou 17.500 milhas), é um ato de protagonismo popular e de descarbonização em prática, contrastando com o alto impacto de carbono da aviação que movimenta a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 30). A Flotilha, organizada em solidariedade aos Eixos de Convergência da Cúpula dos Povos, materializa a urgência da Justiça Climática e a defesa dos territórios e “maretórios”. A viagem, que incluiu paradas em Santa Cruz de Tenerife e Mindelo, Cabo Verde, trouxe para a Amazônia vozes cruciais do Sul Global, como a da ativista Melody Barry-Yobo, de Ogoniland, Nigéria, que uniu a luta contra a extração de combustíveis fósseis no Delta do Níger à causa amazônica. O Confronto de Narrativas Ao chegar a Belém, a missão da Flotilha é clara: disputar a narrativa da conferência oficial, que, segundo ativistas, é dominada por interesses corporativos. “Nós queremos fazer frente à indústria fóssil. Ela estará novamente na Conferência, fará um lobby massivo e por isso é tão importante que o movimento global pela Justiça Climática também esteja lá,” afirma Katharin Henneberger, ex-membro do parlamento alemão e tripulante do Flotilla 4 Change. A iniciativa dos ativistas de viajar em embarcações serve como um laboratório flutuante e uma demonstração pública de que a liderança climática começa com a prática, rejeitando o transporte de alta emissão. Ciência Cidadã e Diversidade a Bordo A bordo dos veleiros, a tripulação opera como um laboratório de ciência cidadã, realizando pesquisas sobre a saúde dos oceanos, incluindo o monitoramento de plástico e a coleta de dados de vida selvagem e qualidade da água. A composição da tripulação é um reflexo direto do compromisso da Cúpula com a diversidade: a bordo estão trabalhadores da terra e do mar, ativistas antirracistas e LGBTQIA+, cientistas, delegados e jovens de diversas nacionalidades. A Flotilha exige que seus membros passem por treinamentos obrigatórios de Sensibilidade Cultural e Antirracismo, reforçando que a luta climática é inseparável das pautas sociais. Agenda em Belém A Flotilha estará em Belém até o final de novembro e tem uma agenda intensa na Cúpula dos Povos: 13 a 14 de novembro: Participação na programação da Cúpula dos Povos, com foco no Eixo “Territórios Vivos e Maritórios, Soberania Popular e Alimentar”. 14 de novembro: Realização de um Evento de Mesa Redonda e Escuta/Aprendizagem a bordo do barco Rainbow Warrior, atracado na Universidade Federal do Pará (UFPA), Rua Augusto Corrêa, 01. 15 de novembro: Adesão massiva à Marcha Popular de encerramento da Cúpula.
Cúpula dos Povos Rumo à COP 30 fortalece a internacionalização com atividades e participação em protestos, em Baku.

Durante a COP 29, realizada entre os dias 11 e 22 de novembro de 2024, em Baku, Azerbaijão, a Cúpula dos Povos Rumo à COP 30 deu passos significativos para ampliar a voz das comunidades resilientes e fortalecer a construção do processo autônomo que culminará na Cúpula em Belém, em 2025. A Cúpula realizou duas atividades estratégicas voltadas para a discussão da construção de um espaço autônomo, aberto a organizações, movimentos sociais e redes que entendem que as soluções para a crise climática devem emergir das vivências e saberes das comunidades que protegem e convivem com os biomas. Além disso, a participação nos espaços e protestos foi marcada por intervenções contundentes, como a de Thuane Nascimento, da Perifa Connection e da Coalizão Negra por Direitos. Thuane destacou a importância de um espaço para debater as demandas das pessoas afrodescendentes nas conferências climáticas. “Nós não temos ainda um espaço para poder debater uma Constituinte das pessoas afrodescendentes. Seria incrível se o Brasil tomasse à frente dessa causa e, como presidência da COP, colocasse isso na mesa: queremos que as pessoas afrodescendentes, as pessoas negras, como falamos em nosso país, tenham espaço também para debater suas demandas nos espaços da Conferência das Nações Unidas para a Mudança do Clima, as COP”, disse. A Cúpula dos Povos tem articulado esse debate e seguirá mobilizando para que a pauta racial esteja presente na agenda climática global antes, durante e depois da COP 30. A presença em Baku foi fundamental para estreitar laços com movimentos internacionais, fortalecer o internacionalismo das lutas e consolidar a participação popular nos processos de decisão sobre a crise climática. Com mais de 400 organizações assinando a Carta Política da Cúpula e 325 participantes na última Plenária Virtual, realizada em 8 de novembro, o compromisso de construir um processo autônomo, popular e representativo segue firme. A Cúpula dos Povos reafirma que a Amazônia é nossa, e o futuro é agora.
